quinta-feira, 30 de março de 2017


Sou intuitiva, cada vez mais, e encontro-me encalhada por vezes, na vida, por receber sinais que me baralham. A vida entrega-se, cai do céu – cada vez mais e mais depressa - e pede que nos entreguemos também. É um namoro ainda muito exigente para mim, mas vou tentando. (Nota: estaria prestes a cair do céu um cancro...)

Gosto de ler, de conhecer, mas acredito que os livros não são para seguir, mas apenas para beber. Depois seguimos o coração. Cada vez mais acredito que o coração não serve apenas para a vida pessoal, para o companheiro, a família e os amigos, mas também para a vida profissional. Tudo o que já vem formatado vai cair por terra e as soluções vão encontrar-se cada vez mais no que sentimos, assim que aprendermos a escutar. Ainda estou nos treinos, mas já o faço há bastante tempo. Vou ao encontro do momento.

É-me difícil planear, mas sempre tento. Depois vem a vida e ensina-nos que a vida é aqui e agora e que os planos são apenas para limpar a mente. 

Ainda assim, quando tudo se complica, penso que seria mais fácil seguir uma vida certinha e direitinha, com final conhecido. Mas a verdade é que acabo por nunca ir por esse caminho e, no fundo, sei que não é por aí, embora a ordem seja necessária. 

Choro. Choro muito. Tenho fases. Meses e meses sem chorar, para um dia o copo encher e me apetecer fazer como os bebés, chorar e chorar no colo. 

Gosto de crianças, porque representam o sonho, a esperança, a ingenuidade (nem tanto), a espontaneidade,  a transparência, a sensibilidade e a inteligência mais intuitiva. Gosto de crianças, porque os adultos me assustam com as suas frases feitas, os seus bloqueios e os seus medos e me fazem assustar com as minhas frases feitas, os meus bloqueios e os meus medos. 

Porque não continuamos todos a ter medo só do bicho-papão que se esconde à noite debaixo da cama ou dentro do armário? Se calhar, é só mesmo esse o nosso medo a vida toda…
(escrito a 24.1.2012) 
                                                                                                                                                                                                       









segunda-feira, 27 de março de 2017



Facilmente vivo sem as coisas de que gosto porque preciso delas para saber que as gosto. Quando as experimento, lembro-me de que fazem parte de mim e que, por vezes, deixo partes de mim por aí espalhadas. Ainda assim, o que vou espalhando também vou recolhendo e, juntando as pecinhas, é aquilo que sou. 

Continuo a espalhar e a recolher… Às vezes espalho-me ao comprido, às vezes recolho lixos, mas reciclo e transformo para continuar o caminho.

Sou uma pessoa, aparentemente, independente. Aprendi a estar sozinha desde cedo e preciso dos meus momentos para mim, comigo mesma, onde me encontro com coisas de que gosto e em que penso e transformo. 

Mas sei que preciso de ajuda, de me aliar, para o meu potencial se manifestar. 

Aprendi a estar sozinha, porque muitos dos meus dias foram assim, mas sentir-me sozinha depende de outros factores. 

Sinto-me sozinha quando não consigo comunicar, sinto-me sozinha quando não me sinto compreendida, sinto-me  sozinha quando não são honestos comigo, sinto-me sozinha quando tenho de me desapegar… 

No fundo preciso do outro para sentir a solidão. Mas se calhar precisamos sempre do espelho para sentir seja o que for…

(escrito a 24.1.2012)




Foto 2017



sexta-feira, 24 de março de 2017


Cada vez mais acho que não são as terapias que curam, mas, sim, as relações terapêuticas através de um mediador terapêutico. Cada vez mais acho que nenhum remédio por si só tem grande valor se o movimento de cura não for carregado de intenção. 

1) A relação

Fiz duas sessões de acupuntura, no último mês, por exemplo, mas pouco de serviria ter as agulhas espetadas - que, ainda por cima, me fazem sentir dores e me remetem para as experiências passadas nos internamentos hospitalares - se não me revisse na terapeuta, não tivesse ali um lugar seguro e contentor e não me sentisse bem. E esta parte do sentir bem é o meu barómetro para saber se estou no sítio certo. Porque somos pessoas e, em última análise, a maior parte dos sintomas, a um nível mais profundo, existem num espaço relacional, interferem com as relações e condicionam a forma como estamos no mundo. 

2) A intenção

É verdade que há comprimidos que tiram dores mas também há os que é suposto tirarem-nas e não tiram. Não sei se agulhas espetadas por si só, nos meridianos corretos, fazem tudo. Ou fazem nada. Para mim, seja o que for que escolher fazer para o meu bem-estar é potenciado pela minha intenção. Posso juntar-lhe um pensamento, posso observar um sentimento, uma sensação. A consciência, a conexão e a intenção são as três fadas catalizadoras, as verdadeiras injeções da energia da mudança. Nem tudo exige consciência - ficaríamos loucos! A outra parte é fé, crença e devoção. Mas até a fé nos dá uma direção. 



quinta-feira, 23 de março de 2017


Quis a vida que eu desenvolvesse teorias através de uma metodologia empírica, vivencial, experiencial, de observação mas, sobretudo, que o meu pensamento fosse sendo reformulado e transformado com as minhas vivências e as daqueles que me acompanham. As minhas ideias não vêm da clínica ou da investigação formal, mas vão beber a muitos pensadores e sentidores que já cá andaram e ainda andam. Depois há as descobertas que vou fazendo com base na experiência. E observar tanto posso fazê-lo no plano pessoal como no plano profissional.

Durante algum tempo, achei que a saúde e a doença estavam em pólos opostos, que à saúde correspondia uma energia criativa e que, à doença, uma energia não criativa, de repetição. Queria com isto dizer que adoecer tem muito de manter padrões antigos, de energia estagnada, de bloqueios e resistências à mudança. Penso que este tipo de pensamento dicotómico - esta coisa alternada, mutuamente exclusiva - está cada vez mais ultrapassado. A dualidade vem com a vida - precisamos de a experienciar para conhecer o bom e o mau, o quente e o frio, o dia e a noite, o sim e o não, o longe e o perto, a separação e a união, o certo e o errado, o normal e o anormal, o masculino e o feminino, a alegria e a tristeza - mas serve o propósito de conhecimento e tomada de consciência. E de diversão porque, se fôssemos todos indiferenciados, seríamos amebas estupidificadas. Seria tudo muito mais chato. 

Hoje entendo a doença como um grande grito criativo, uma solução que o corpo encontra para se orientar, para se reencontrar, para compensar desequilíbrios homeostáticos, para continuarmos a viver apesar da ideia de que um dia vamos morrer. Temos muito medo da doença porque estabelecemos que era a inimiga da saúde. No dia em que olharmos para os sintomas como aliados e não como inimigos, acredito que tudo vai mudar. Claro que ninguém gosta de estar doente, mas vivemos num tempo em que não se aguenta uma febre ou uma dor de cabeça! 

Acredito que a forma de olharmos para a realidade caminha para uma abordagem mais circular, mais copulativa (e) e menos disjuntiva (ou). A minha ideia inicial estava errada? Não, continuo a considerar que batemos muito na mesma tecla e que isso não é muito criativo porque nos impede de crescer. Por outro lado, também acredito que doença é criatividade, porque o nosso corpo é capaz de criar os quadros mais geniais para fazer frente aos desafios que enfrenta. É difícil assumir isso porque exige honestidade.

Talvez a categorização e a problematização da maior parte dos sintomas, do desconforto, da dor e do mal-estar nos afaste deste entendimento. Não há espaço para sentir. Não sou a favor da indiferenciação, mas de uma capacidade de pensar mais abrangente. Não defendo a eliminação da polaridade porque nela se começa e se encerra a vida. A dor enraíza, o amor eleva-nos, mas há camadas. No meio, existem variadíssimas hipóteses, tantas quantos os sujeitos que habitam os corpos que gritam. Mas é preciso ouvir.



sábado, 18 de março de 2017



É dificil saber o caminho certo, mas, se usarmos o corpo todo - não só a cabeça, não só o coração - fica tudo mais fácil. E mais confuso. Porque são muitas as sensações, são muitos os sinais. O corpo é mais verdadeiro. Cruzamos os braços, as pernas, encolhemo-nos, fechamos o peito, resistimos. Abraçamos, sentimos, colamos os corações, sonhamos e permitimos. E às vezes tudo isto. 

Cada vez me parece mais certo que a vida nos devolva o que somos, que nos mostre em que ponto estamos e que nos espelhe as coisas que criticamos nos outros e que, no fim das contas, também são nossas. As diferenças entre nós não são assim tantas. Às vezes estamos é entretidos a completar-nos, daí a diferença: enquanto um diz entra, o outro diz sai; enquanto um diz chega, o outro diz mais; enquanto um tenta, o outro desiste; enquanto um procura, o outro acha; quando um achou, o outro ainda não encontrou. É só porque andamos pela metade.

Afinal o que é isto de "ser do contra"? Não é só a procura da razão; é, sobretudo, a procura da outra metade, da outra forma de ser - para nos sentirmos completos. Por isso confundimos encontros com desencontros e amores com desamores, quando estamos à procura do oposto que atrai, porque é o oposto que completa. 

"Se eu sou maluco, tu também és!", dizia ele. Não estamos sempre em desacordo. Às vezes somos semelhantes. Quando já não há nada a perder. Quando só faltou viver. Quando a sintonia é maior com a distância. Quando cada pormenor tem importância. 





quarta-feira, 15 de março de 2017


Viver é permitir que a vida surja e não que urja.  

Ou bem que a vida urge ou bem que a vida surge. A urgência é a necessidade de resolver uma situação de-pressa. A pressa é a necessidade de não perder tempo. O tempo é aquilo que perdemos quando não sabemos esperar. Esperar é a sabedoria do paciente. Paciente é aquele que é ciente da sua paz. InPaciente é também aquele que é ciente da falta dela, quando dói. 

Ou bem que a vida urge ou bem que a vida surge. Não é por acaso que a ansiedade e a angústia prevalecem nos dias-que-correm. Ficou sempre alguma coisa por fazer, estamos sempre atrasados ou em falta com alguma coisa. Na melhor das hipóteses, para quem não gosta de falhar com os outros, em falta com as nossas necessidades. A culpa, sempre a culpa.

Se a vida urge, é preciso agir depressa, não vá o Diabo tecê-las. Deixei de correr. É por isso que não falo muito aqui de sintomas, porque as doenças despoletam a urgência de agir - em mim e nas pessoas à minha volta, que é o que eu não quero alimentar. "Tens de fazer isto, tens de fazer aquilo!" Já fui três vezes "às urgências" este ano. Ainda assim, consciente da condição urgente inerente à falta de saúde, pedi para mim cALMA e lucidez. E é assim que vamos. Sem pressa e sem pausas, como a tartaruga. O que é que para mim é tão urgente? O que para mim é tão difícil de aguentar que não pode esperar? 

O mundo pode acabar amanhã? Pois pode. A saúde pode acabar amanhã? Pois pode. O amor pode acabar amanhã? Pois pode. O dinheiro pode acabar amanhã? Pois pode. Todos os dias acabam. E todos os dias acabam estas coisas - faz parte. A esperança pode acabar amanhã? Não. Porque a esperança é sobre recomeços. Então decidi que tenho tempo. 

Já me retiraram o tempo algumas vezes, nomeadamente em hospitais onde não tive hipótese de pensar, ponderar, tomar decisões conscientes e sentidas. E não só. Foi necessário? Talvez. Seria obrigatório? Não sei. Nunca vou saber. Sei que as minhas células preservam essas memórias e por isso as repetem.

Eu não quero viver cada dia como se fosse o último, porque isso seria, todos os dias, o pânico total, um ti-no-ni permanente nas estradas e passar a vida a despedir-me das pessoas - "até um dia, se Deus quiser!". 

Sabem aquela sensação de atravessar a estrada, ver um carro na nossa direção e parar à frente dele, em vez de fugir? Deixamo-nos atropelar, é verdade. Ainda assim, prefiro pensar em viver cada dia como se fosse o primeiro, o da descoberta, o da paixão, o do entusiasmo. Pensando melhor, prefiro mesmo viver cada dia como se fosse o do meio, com a segurança do antes e do depois, porque, mesmo que o depois nos falte, o depois existe sempre no coração, pelo menos, enquanto ele bate. 


Deixar que a vida surja é confiar, saber que o corpo sabe mesmo quando eu não sei, saber que a vida sabe mesmo quando eu não sei, saber que tudo está onde deve estar mesmo quando não parece, saber sem saber - crer. 

quinta-feira, 9 de março de 2017



Parte I

O corredor é, ao mesmo tempo, aquele que corre e um sítio que se percorre. Fiz muitas piscinas no corredor do piso 2 do Pavilhão de Medicina do IPO de Lisboa, de carrinho na mão, de um lado ao outro. Era só um, um corredor, com alguns sofás no caminho. Os sofás azuis, grandes poltronas! Azul é também a cor que associo ao Hospital de Cascais. Deve ser por ser a cor que acalma, sendo também a que entristece (blues). Só desmaiei uma vez. Não sou muito de desmaios. Imaginem uma pessoa que tem dificuldades em adormecer: eu. Como é que eu ia ser pessoa para desmaiar? Haverá mais perda de controlo do que andar a desmaiar por aí? Então, perdi os sentidos uma vez no corredor. Não sei bem como, acordei já na cama. Seria a 1, a 3, a 5, a 7 ou a 9? Só morei em camas de número ímpar. Em quartos sempre de quatro camas. E o corredor era para andar, para me mexer, principalmente depois dos quase 10 kgs perdidos no primeiro mês de internamento. “Não te quero na cama!”, diz a Dra. S., chefe de equipa, quando chego no segundo internamento, já mais recuperada das maldades do primeiro ciclo de quimioterapia. E aquele corredor era aquele corredor, com princípio, meio e fim, para a frente e para trás, de um lado ao outro, uma e outra vez. E a vista da janela, um mundo que corria lá fora. No corredor, não se corre. Os doentes nunca correm. Podem correr os enfermeiros, os médicos, os familiares, os auxiliares - para acudir - mas os doentes não. A vida vai lenta quando se adoece. O tempo não passa - escapa.

Parte II


Descobri esta semana que não gosto de corredores desconhecidos, corredores labirínticos infindáveis, onde me desoriento e me perco. E se for urgente? E se tiver pressa? Não gosto. Mostrem-me o caminho. Estou farta de procurar caminhos. Deem-me um corredor e eu faço-o vezes sem conta, para trás e para a frente, para a frente e para trás. Sempre tive bom sentido de orientação. Não me importo de me perder nas estradas, porque sei que vou sempre encontrar o caminho. Mas esqueçam lá os corredores onde toda a gente corre de forma lenta. Porque a vida fica assustadoramente lenta quando queremos que corra. E porque, na tua vida, nem sempre és tu o corredor. 


domingo, 5 de março de 2017


No último ano e meio, ando aqui num triângulo do qual eu pouco faço parte. É um triângulo cujos vértices são o IPO, o Centro de Saúde de Cascais e o Hospital de Cascais. Não me parece que haja comunicação entre os intervenientes, mas é natural: são sempre assim as relações disfuncionais. Eu no meio. 

Desde que desisti dos tratamentos, continuei a ser acompanhada no IPO como qualquer outro doente que finalizou o protocolo. Recordo que tive um diagnóstico de um cancro no último estadio. Quantos exames de imagem fiz desde a remissão de Maio de 2013? 0! O que eu faço quando vou à consulta? Um hemograma normal e Urina. 

Na última consulta, em Novembro de 2016, depois de 4 meses sem dormir, com dores de cabeça que eu associei à medicação que me deram no centro de saúde e com enjôos que me levaram a perder 6kgs (a parte boa!), a Dr. F. pediu uma ressonância magnética. Continuo à espera. Já perdi a conta da quantidade de vezes que pus os pés nestes 3 estabelecimentos no último ano. Para o médico de família, tudo se resume a ansiedade. No IPO, não valorizam porque não estão a contar que o cancro volte. No Hospital de Cascais, onde o cancro foi diagnosticado, tenho de dizer que tive um linfoma, perguntam se estou a ser acompanhada no IPO e pronto. Vou só recuar até Agosto de 2015. 

Agosto 2015 - Infeção ginecológica + Infeção urinária

Outubro 2015 - Infeção urinária

Dezembro 2015 - Infeção urinária

Janeiro 2016 - Agravam-se as insónias. Depois de 5 meses de dores e desconforto, mantêm-se os sintomas urinários sem infeção urinária ou resultados positivos na urocultura. Telefono à médica do IPO, que diz que já não é com ela - para ir ao centro de saúde para ser encaminhada para a Urologia. O médico de família não entende que seja caso para isso. Faço ecografia e a bexiga está normal. Consulto o meu biopsicoterapeuta Alain Jezequel, faço alguns suplementos por conta própria e os sintomas melhoram. 

Julho 2016 - Deixo de dormir completamente, a qualquer hora do dia. Deixo de conseguir adormecer. Começo pelos suplementos naturais que deixam de fazer efeito.

Agosto 2016 - Pneumonia, enjôos e insónias. Sou acompanhada no Centro de Saúde, com tratamento para a pneumonia e diagnóstico de ansiedade. Experimentem não dormir e estar fisicamente esgotados com infeções e dores e depois digam-me se é ansiedade... Começa a saga do Zolpidem para dormir. De férias, dormi 2h por noite durante o mês de Agosto, sempre com enjôos durante o dia. As dores de cabeça são diárias. 

Setembro 2016 - Começo o Triticum, um anti-depressivo para tratar a insónia. Não me faz dormir e pioro da cabeça. Mantenho o Zolpidem e, até Outubro, andei neste filme, a pensar que endoidecia. Reduzo drasticamente as horas de trabalho e a capacidade de funcionar. Já teria perdido uns 4 kgs porque os enjôos não me permitiam comer. Começo a ir às consultas de Psico-Oncologia.

Outubro 2016 - Vou à urgência do IPO. A Dra. S. diz que o linfoma que tive, por ser tão agressivo, costuma voltar nos dois primeiros anos e, como tal, já não contam que volte. Certo. Encaminhou-me para a Psiquiatria para ajustar a medicação das insónias e pediu ressonância magnética crâneo-encefálica. Como saí de lá? Exatamente na mesma como entrei, com dores de cabeça e enjoada. Vou ao Centro de Saúde e substituo o Triticum por uma benzodiazepina (ansiolítico). Assim que retiro a medicação (Zolpidem e Triticum), melhoram as dores de cabeça. 

Novembro 2016 - Vou à consulta de rotina do IPO. A Dra. F. diz que não tinha nada pedido no sistema. E eu em casa à espera. Pede, então, consulta de Psiquiatria e ressonância. Agora é que é! Estive sem dançar desde Julho. Regresso à dança assim que começo a dormir com mais regularidade. 

Janeiro 2017 - Finalmente a consulta de Psiquiatria. Nesta fase, depois de um ano inteiro de sofrimento, já estou a dormir todas as noites, mas a psiquiatra substituiu o Kainever - que estava a fazer enquanto aguardava consulta - por uma benzodiazepina mais leve, o Rivotril. O estômago ainda está sensível mas já não tenho enjôos permanentes. No dia 16, começam os sintomas urinários.

Jan/Fev/2017 - Depois de 3 idas às urgências do Hospital de Cascais - que não vou descrever porque dizer que fui lá 3 vezes já diz muito -, depois de dois antibióticos para a infeção urinária, fico boa da sinusite de um mês e do estômago, mas os sintomas urinários/pélvicos continuam. Vou à urgência ginecológica e confirmo que um dos miomas que tenho está encostado à bexiga. 

Março/2017 - Entendo finalmente esta saga dos sintomas urinários que já vem desde 2015. Tenho 3 miomas e o maior tem 3.6 cm. Na urgência ginecológica, encaminharam-me para a consulta externa de ginecologia, a qual tenho de aguardar. Assim como fiquei a aguardar até hoje a ressonância de Outubro. Fui a uma consulta de MTC (medicina tradicional chinesa). Volto a parar de dançar, mantendo apenas aquilo a que chamo de "serviços mínimos". O trabalho, ainda assim, é promotor de saúde mental. Ainda se segrega muito a saúde, o corpo, a pessoa. 

Não vou ao ginecologista desde 2012, porque fui fazendo as consultas no planeamento familiar no Centro de Saúde; no IPO não valorizaram as menstruações sempre irregulares e mais frequentes. Sei dos 3 miomas desde que terminei a quimioterapia, porque marquei consulta de planeamento familiar depois dos tratamentos. Tenho feito ecografias ginecológicas quase anuais. Nunca o médico de família associou os sintomas urinários aos miomas. Tive, algures nestes 4 anos, quistos hemorrágicos no ovário direito, que desapareceram. Nunca fui encaminhada para a ginecologia, nem no IPO nem no centro de saúde. Fui eu que disse à médica da urgência geral que tinha os miomas e questionei se não podiam ser a causa dos sintomas urinários. Porquê? Porque pesquisei no google. 

Esta é a parte chata que não costumo publicar. Tudo o resto é sempre verdade: a criatividade, a dança, a esperança, o amor, o desamor, o medo, a vida, o humor, o sorriso, a loucura.. É o que me segura nos intervalos. 

Nestes últimos 5 anos, cruzei-me com médicos que deviam ter escolhido outra profissão, bem como com médicos que escolheram a profissão certa e pelos quais me sinto grata. Mas há algumas realidades: 

a) a responsabilidade dilui-se, a visão é repartida e tripartida. Só quem vive no próprio corpo tem a visão completa. 

b) o SNS está a rebentar pelas costuras! 

c) existem muitos preconceitos no que diz respeito à saúde feminina! Já ouvi com cada coisa! Para a m**** se andar sempre com infeções urinárias é normal por ser mulher! 

d) existem muitos preconceitos no que diz respeito à psicossomática e à saúde em geral. Os sintomas não são "ansiedade" nem fruto do nosso stress. Ainda que o stress gere sintomas fisiológicos e vice-versa, estes são reais: existem! 

Para ser justa com aquilo em que acredito, teria de fazer uma cronologia dos acontecimentos da minha vida e das emoções que acompanharam os eventos e os sintomas, mas hoje o post é dedicado ao corpo, à fisiologia, não porque segregue mas porque é uma parte que não gosto de expor. Ainda assim, faz parte do caminho da cura. No dia em que escrever um livro, vou ter de fazer o paralelo emocional, mental e espiritual deste caminho, para não haver batota! 

E vou parar de escrever porque tenho de ir à casa-de-banho. Para variar. :)


Lado A e Lado B






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